Raquel Pereira Gonçalves
Resumo
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) recentemente afetou à sistemática dos recursos repetitivos o Tema 1273, que discute o marco inicial do prazo decadencial para a impetração de mandado de segurança contra obrigações tributárias que se renovam periodicamente. Nos recursos REsp 2.103.305-MG e REsp 2.109.221-MG, há divergências sobre se o prazo de 120 dias deve começar a contar a partir da entrada em vigor do ato normativo que institui ou majora o tributo, como defende o Estado de Minas Gerais, ou de cada ato concreto de cobrança, como sustentam os contribuintes. A decisão do STJ sobre essa questão poderá representar uma mudança significativa na jurisprudência, impactando a segurança jurídica e a litigiosidade tributária no Brasil, ao uniformizar a interpretação sobre o prazo para impetração do mandado de segurança.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) recentemente afetou, sob a sistemática dos recursos repetitivos, a controvérsia acerca do marco inicial do prazo decadencial para a impetração de mandado de segurança com o objetivo de impugnar obrigações tributárias que se renovam periodicamente. Este artigo tem como objetivo analisar as implicações dessa discussão, considerando os acórdãos paradigmáticos REsp 2.103.305-MG e REsp 2.109.221-MG, que sustentam argumentos distintos sobre o início da contagem do prazo para a impetração.
O mandado de segurança é um remédio constitucional utilizado para proteger direito líquido e certo, sendo amplamente utilizado em questões tributárias para impugnar cobranças que os contribuintes consideram indevidas. A questão que se coloca no Tema 1273 é o momento exato em que começa a contagem do prazo de 120 dias para a impetração do mandado de segurança em relação a obrigações tributárias periódicas.
Nos casos de obrigações que se renovam periodicamente, como tributos que incidem sobre fatos geradores recorrentes (exemplo: ICMS, PIS/COFINS), a jurisprudência tradicionalmente entendia que o prazo decadencial não correria desde a edição do ato normativo, mas sim de cada ocorrência de cobrança indevida, por se tratar de uma relação de trato sucessivo.
Nos REsp 2.103.305-MG e REsp 2.109.221-MG, o Estado de Minas Gerais argumentou que o prazo para a impetração do mandado de segurança deveria começar a contar a partir da entrada em vigor do ato normativo que deu origem à obrigação tributária. Esse entendimento, se acolhido, implicaria na impossibilidade de se impetrar o mandado de segurança após 120 dias da edição da norma que instituiu ou majorou o tributo, mesmo que o contribuinte só venha a sofrer a cobrança em um momento posterior.
Por outro lado, a defesa dos contribuintes, apoiada em precedentes anteriores do STJ, sustenta que, em se tratando de tributos de trato sucessivo, o prazo decadencial de 120 dias deveria ser contado de cada ato concreto de cobrança, ou seja, de cada vez que o contribuinte sofre a incidência do tributo. Esse entendimento é baseado na ideia de que a obrigação tributária se renova a cada novo fato gerador, o que justifica a possibilidade de impetração do mandado de segurança para evitar sucessivas cobranças indevidas.
Caso o STJ adote o entendimento defendido pelo Estado de Minas Gerais, estaríamos diante de uma significativa ruptura com a jurisprudência consolidada, gerando impactos diretos na segurança jurídica dos contribuintes. A mudança poderia restringir o acesso ao mandado de segurança, obrigando os contribuintes a impetrarem ações rapidamente após a edição do ato normativo, mesmo antes de sofrerem efetivamente a cobrança indevida.
Isso também poderia aumentar a litigiosidade no país, pois, para evitar a decadência, contribuintes seriam forçados a ingressar com ações preventivas contra normas tributárias que sequer foram aplicadas a eles até aquele momento.
O STJ, ao afetar a matéria ao rito dos recursos repetitivos, visa uniformizar a interpretação sobre o prazo decadencial em relação ao mandado de segurança em obrigações tributárias periódicas. A decisão a ser tomada pela Primeira Seção terá caráter vinculante, impactando todos os tribunais do país e orientando a conduta dos contribuintes e da administração tributária.
Os precedentes indicados, especialmente o REsp 2.103.305-MG e o REsp 2.109.221-MG, refletem a divergência existente e a complexidade da matéria. A análise cuidadosa desses acórdãos é essencial para entender os argumentos que poderão prevalecer na futura decisão do STJ.
A definição do marco inicial do prazo decadencial para a impetração de mandado de segurança no contexto de obrigações tributárias que se renovam periodicamente é uma questão de grande relevância para o direito tributário brasileiro. O desfecho do Tema 1273 pelo STJ terá implicações profundas na segurança jurídica e na forma como os contribuintes lidam com a litigiosidade tributária.
Aguarda-se a decisão do STJ com grande expectativa, pois ela poderá estabelecer um novo parâmetro na jurisprudência tributária, influenciando diretamente o comportamento de contribuintes e do fisco nas próximas décadas.
REFERÊNCIAS
Brasil. Superior Tribunal de Justiça. REsp 2.103.305-MG: ProAfR no Recurso Especial nº 2103305 – MG. Relator: Ministro Paulo Sérgio Domingues. Diário da Justiça Eletrônico, Brasília, DF, 20 ago. 2024. Disponível em: https://processo.stj.jus.br. Acesso em: 29 ago. 2024.
Brasil. Superior Tribunal de Justiça. REsp 2.109.221-MG: ProAfR no Recurso Especial nº 2109221 – MG. Relator: Ministro Paulo Sérgio Domingues. Diário da Justiça Eletrônico, Brasília, DF, 20 ago. 2024. Disponível em: https://processo.stj.jus.br. Acesso em: 29 ago. 2024.
SILVA, Regina Helena. Mandado de Segurança: Aspectos Processuais e Materiais. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2023.