Rubens Vasconcelos Calixto Neto
Em 04 de junho de 2024, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) prolatou decisão no Recurso Especial nº 1503485/CE que gerou precedente sobre a questão da aplicação do prazo prescricional em ações que versam sobre bens alienados fiduciariamente.
No julgamento, entendeu a Quarta Turma que apesar de estar prescrita a pretensão de cobrança do bem alienado, por ter passado prazo maior que cinco anos, segundo a aplicação do art. 206, § 5º, inciso I, do Código Civil, o mesmo prazo prescricional não se aplica ao direito à retenção do bem alienado.
O relator do caso, ministro Antônio Carlos Ferreira, seguido em unanimidade pelos demais ministros, compreendeu que, à luz do art. 205 do Código Civil, o prazo para ajuizar a ação de busca e apreensão do bem alienado seria adequada à regra geral e, por conseguinte, somente prescreveria em dez anos.
Neste sentido, apesar do direito à pretensão judicial de cobrança estar extinto, ou melhor, prescrito, o objeto substancial do contrato era, na verdade, a obrigação pecuniária. Esta é a razão pela qual a prescrição não abarcou a garantia real do contrato de alienação fiduciária, conforme as palavras do relator.
Outro fundamento utilizado no julgamento, baseado inclusive em precedente do STJ (REsp 844.098), foi de que diante da inadimplência pela ausência de pagamento pelo devedor, a posse do bem em alienação fiduciária tornou-se injusta, à medida que se consubstancia a causa de pedir que enseja o direito à busca e apreensão.
Ademais, o processo de busca e apreensão possui procedimento autônomo e independente, segundo o art. 3º, § 8º, do Decreto-Lei n. 911/1969, de modo que seria inaplicável o prazo quinquenal pelo art. 206, § 5º, inc. I, do Código Civil, pois não se tratava o objeto do caso concreto demanda que visava a cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular, mas, sim, a retenção de bem alienado em posse injusta.
Aliás, no que diz respeito à posse injusta do bem, como no contrato de alienação fiduciária o credor se investe na propriedade e posse indireta do bem, por disposição e prerrogativa do art. 1.228 do Código Civil, tem “o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”.
E, por fim, o último argumento material utilizado pela Quarta Turma foi que a prescrição na esfera civil não extingue direito obrigacional, porquanto seus efeitos somente repercutem sobre a pretensão judicial, e, diversamente da seara tributária, subsiste a obrigação, podendo, inclusive, ser quitada sem direito de ser reavida (art. 884, CC), ou, como analisado no caso concreto, ser retido o bem pela busca e apreensão se não extrapolado o prazo decenal (art. 205, CC).
Em síntese, embora a pretensão de cobrança do bem alienado esteja prescrita após o prazo de cinco anos, esse mesmo prazo não se aplica ao direito à retenção do bem. Assim, mesmo com a prescrição da ação de cobrança, a garantia real do contrato de alienação fiduciária não foi afetada, permitindo a possibilidade de busca e apreensão do bem em posse injusta, segundo o recente precedente editado pelo Superior Tribunal de Justiça.