Miyslaine Alves de Souza
Os contratos de locação de imóveis urbanos residenciais e não residenciais, são regidos pelas disposições da Lei nº 8.245/91, que prevê os procedimentos específicos que deverão ser seguidos em relação a cada tipo de locação.
Dentre os procedimentos previstos, o art. 37 da referida Lei dispõe acerca das modalidades de garantias que podem ser exigidas pelo Locador, dentre elas a garantia da caução, que conforme o art. 38, pode ser imóvel ou móvel. Sendo esta última, em sua maioria, representada pela caução em dinheiro, a qual cumpre mencionar certas considerações.
A caução em dinheiro, encontra-se prevista pela art. 38, §2º da Lei de Locações, a qual prevê que não poderá exceder o equivalente a três meses do aluguel convencionado, devendo ser depositada em caderneta de poupança, autorizada e regulamentada pelo Poder Público.
Por conseguinte, o art. 39 da mesma Lei, determina expressamente, que em regra, as garantias contratuais se estendem até a devolução do imóvel, sendo que, após a rescisão do contrato, por cumprimento das obrigações entre as partes, os valores caucionados devem ser restituídos ao Locatário.
Acontece, que em alguns casos, mesmo após a rescisão do contrato de aluguel, o Locador se nega a restituir a caução prestada pelo Locatário, ao entender pela existência de infração contratual pendente de reparação, como por exemplo quando há aluguéis em atraso ou suposta divergência entre o laudo de vistoria inicial e de vistoria final.
É muito comum, nestas hipóteses, que o Locador retenha automaticamente, os valores caucionados, na intenção de reparar o eventual dano suportado. Todavia, conforme a própria natureza jurídica da caução, esta não se trata de modalidade de pré-pagamento, disponível a qualquer momento para eventual retenção ou
1 Bacharel em direito pela Universidade Estadual de Maringá – UEM. Advogada do Setor Cível Empresarial do Federiche Mincache Advogados Associados. e-mail: <miyslaine.alves@fmadvoc.com.br>
levantamento por parte do Locador, mas sim, de garantia contratual, não sendo permitida, em hipótese alguma, sua retenção automática.
Deste modo, parafraseando o Ministro Lino Machado no acórdão do julgado da AC nº10111704-20.2018.8.26.0004, julgada em 28/09/2020, pela 30ª Câmara de Direito Privado do E. TJSP, a caução é uma garantia, assim, não pertence ao locador, devendo apenas ser utilizada como medida assecuratória de cumprimento das obrigações do locatário. Tem-se assim, que, os valores caucionados só podem ser utilizados pelo Locador em caso de inequívoco descumprimento por parte do Locatário, quando evidenciada infração contratual apta a justificar a eventual retenção.
Nesse sentido, faz-se necessário mencionar precedentes jurisprudenciais do E. TJSP, como o acórdão nº 1031280-45.2019.8.26.0506, julgado em 17/12/2020, que a “retenção da caução pelo locador, não demonstrado inadimplemento que a justifique ou mesmo ação judicial para cobrar eventual débito, revela-se arbitrária”.
Ademais, a retenção injustificada e/ou infundada da caução é passível de reparação pela fixação de indenização dos danos morais, conforme os precedentes do acórdão nº 0001034-32.2018.8.16.0204, da 3º Turma Recursal do E. TJPR, julgado em 08/02/2021 e, do acordão nº 0006049-04.2017.8.16.0014, da 1º Turma Recursal do E. TJPR, julgado em 12/03/2019.
Da mesma forma, é passível de justificar a incidência da multa compensatória – cláusula penal – isto pois, a restituição da caução é uma imposição legal, cujo não atendimento faz incidir a cominação estabelecida para reparação das infrações contratuais, conforme o entendimento do acórdão nº 1121797-29.2014.8.26.0100, de relatoria do Ministro Neto Barbosa Ferreira, julgado em 23/04/2021.
Deste modo, conclui-se que a caução pecuniária, apresentada como garantia do cumprimento de um contrato de locação, deve ser restituída ao Locatário quando o contrato for rescindido, sendo que, quando incontroverso o descumprimento de alguma cláusula contratual, eventuais valores a serem cobrados ou indenizações a serem reparadas, devem ser pleiteadas em ação judicial.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 8.245 de 1991. Dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas pertinentes. Diário Oficial, 18 de out. de 1991.