Luana Moreira Martins
Tratando-se de obrigação de pagar, e valendo-nos dos dizeres de Orlando Gomes citado por Silvio de Salvo Venosa, celebrado o negócio entre as partes, exerce o credor uma sujeição sobre o patrimônio daquele com quem foi celebrado o contrato, servindo o patrimônio de garantia quanto ao adimplemento da obrigação. Tal sujeição seria o fim remoto da relação obrigacional, enquanto o direito de crédito seria o seu fim imediato2.
A Ação Pauliana, também denominada Ação Revocatória, constitui um mecanismo jurídico destinado à salvaguarda dos interesses dos credores frente a atos fraudulentos perpetrados pelo devedor. Seu propósito primordial é a invalidação de atos praticados pelo devedor que comprometam a integridade do seu patrimônio, conferindo aos credores a possibilidade de fazer retornar ao patrimônio do devedor os bens por ele alienados de forma fraudulenta.
Conforme estabelecido no artigo 158 do Código Civil brasileiro, os negócios jurídicos que envolvem a transmissão gratuita de bens ou a remissão de dívidas, realizados pelo devedor já insolvente ou que o levem à insolvência, podem ser anulados pelos credores quirografário. O objetivo da ação é obter o reconhecimento da ineficácia relativa do ato jurídico, limitando seus efeitos ao montante do débito existente do devedor em relação ao autor da ação.
1 Luana Martins Moreira: Advogada Associada do Escritório Federiche Mincache. Pós-graduada em Prática Proc. Civil Avançada nos Tribunais pela Faculdade Damásio Educacional; Pós graduada em Direito Societário e Contratos Empresariais pela PUC-PR; Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Maringá.
2 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Vol. II – Teoria Geral Das Obrigações e Teoria Geral Dos Contratos – 13ª ed. São Paulo : Atlas, 2013, pág. 89.
Para isso, o requerente deve demonstrar que seu crédito antecede ao ato fraudulento, que o devedor estava ou, por decorrência do ato, ficou insolvente, e que o adquirente ou beneficiado tinha ciência da fraude (scientia fraudis).
Pela interpretação do dispositivo legal mencionado, é perceptível que o legislador estipula que os atos questionados devem ter sido praticados por um devedor que já se encontrasse insolvente, ou que tais atos tenham contribuído para sua insolvência. Consequentemente, de acordo com o artigo, a determinação da intenção fraudulenta deve ser feita no exato momento da transferência dos bens ou direitos em questão, sendo este o momento crucial para a constatação da situação de insolvência do devedor.
Não obstante a importância de considerar a situação de insolvência no momento da transferência fraudulenta para aplicação da Ação Pauliana, é frequente encontrar casos práticos em que a análise, tanto pela parte credora quanto pelo juízo, é realizada com base na situação patrimonial atual do devedor, desconsiderando a situação financeira deste no momento da transmissão.
A consideração da insolvência no momento da transferência fraudulenta é crucial para proteger de forma eficaz todas as partes envolvidas no negócio jurídico. Isso assegura a justa proteção tanto dos credores, garantindo a execução de seus créditos, quanto do próprio devedor, evitando penalizações injustas por atos que, na época, não configuravam fraude contra os credores. Esta abordagem visa fortalecer a eficácia da Ação Pauliana como um instrumento de defesa dos credores, ao determinar que a avaliação da insolvência seja feita no momento específico da realização do ato contestado.
Essa exigência é essencial para evitar que o devedor seja prejudicado por transações que não indicavam insolvência no momento da sua realização. Assim, ao vincular a determinação da insolvência à ocasião da transferência de bens ou remissão de dívidas, o dispositivo legal busca assegurar que os interesses dos credores sejam protegidos de maneira adequada, ao mesmo tempo em que resguarda o devedor contra sanções desproporcionais baseadas em circunstâncias posteriores à execução do ato.