Aldemir Marques Inacio Junior
A recuperação judicial é um processo legal que visa a reestruturação financeira de empresas em situação de crise econômico-financeira, possibilitando sua continuidade e preservando os interesses dos credores. Nesse contexto, o tratamento dos consumidores que mantêm relação com tais empresas é de suma importância e suscita diversas questões jurídicas, especialmente no que tange à figura do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ).
O IDPJ é um instrumento jurídico pelo qual se busca responsabilizar os sócios ou administradores de uma empresa por dívidas ou obrigações assumidas pela pessoa jurídica. No âmbito do procedimento consumerista em empresas em recuperação judicial, o IDPJ desempenha um papel crucial na proteção dos direitos dos consumidores lesados.
Em primeiro lugar, é fundamental compreender que, embora a empresa esteja em recuperação judicial, os direitos dos consumidores não podem ser negligenciados ou desconsiderados. O IDPJ surge como uma ferramenta para garantir que, mesmo diante da crise enfrentada pela empresa, os consumidores prejudicados possam buscar reparação pelos danos sofridos.
Um dos principais desafios nesse contexto é equilibrar os interesses dos consumidores com a preservação da empresa em recuperação. Por um lado, é essencial garantir que os consumidores não sejam prejudicados pela situação financeira da empresa, buscando-se meios eficazes de reparação de danos e compensação por prejuízos sofridos. Por outro lado, é importante não comprometer o processo de recuperação da empresa, que visa sua reestruturação e continuidade no mercado.
Nesse sentido, o IDPJ se mostra como uma ferramenta flexível e adaptável, capaz de ser aplicada de forma a conciliar esses interesses divergentes. Por meio do IDPJ, é possível responsabilizar os sócios ou administradores da empresa por condutas ilícitas ou abusivas que tenham causado prejuízos aos consumidores, sem necessariamente inviabilizar o processo de recuperação judicial.
Além disso, o IDPJ pode ser utilizado como uma medida preventiva, dissuadindo os sócios ou administradores de praticarem condutas que possam prejudicar os consumidores durante o processo de recuperação judicial. A possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica cria um incentivo adicional para que tais agentes ajam de forma responsável e ética, evitando danos desnecessários aos consumidores e contribuindo para a preservação da confiança no mercado.
É importante ressaltar, no entanto, que a aplicação do IDPJ deve ser pautada pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, evitando-se abusos ou excessos que possam prejudicar indevidamente os sócios ou administradores da empresa em recuperação. O IDPJ não deve ser utilizado como um instrumento de punição indiscriminada, mas sim como uma medida voltada para a proteção dos direitos dos consumidores e a promoção da justiça no âmbito das relações de consumo.
Em recente decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), proferida em trouxe importantes reflexões sobre a aplicação da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica (IDPJ) em empresas em recuperação judicial no contexto do direito consumerista. Essa decisão impacta diretamente a dinâmica das relações entre consumidores, empresas em crise e seus sócios, especialmente no que diz respeito à responsabilidade destes últimos frente a eventuais demandas judiciais.
O caso em questão envolveu a desconsideração da personalidade jurídica de uma empresa em recuperação judicial no âmbito de uma ação consumerista. O STJ decidiu, de forma unânime, que o deferimento da recuperação judicial não impede o prosseguimento da execução redirecionada aos sócios da empresa. Tal entendimento é fundamental para garantir a efetividade do direito do consumidor, uma vez que possibilita a busca por reparação de danos mesmo em situações de crise empresarial.
Um aspecto crucial dessa decisão é a aplicação da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, prevista no artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que dispensa a comprovação de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial para sua efetivação. A teoria menor permite a responsabilização dos sócios ou administradores da empresa apenas com a demonstração do estado de insolvência e da obstrução à reparação de prejuízos.
É importante ressaltar que a decisão do STJ estendeu a aplicação da teoria menor não apenas às sociedades limitadas, mas também às sociedades anônimas, desde que os sócios ou acionistas exerçam efetivo controle sobre a gestão da empresa. Isso amplia o escopo de responsabilização dos sócios em casos de desconsideração da personalidade jurídica, independentemente do tipo societário adotado.
Além disso, a decisão esclareceu que o deferimento da recuperação judicial não suspende o prosseguimento das execuções contra terceiros devedores solidários, como os sócios da empresa em crise. Isso significa que eventuais constrições dos bens dos sócios não afetam o patrimônio da empresa em recuperação, não comprometendo, assim, seu processo de reestruturação.
Diante desse cenário, o papel do IDPJ no procedimento consumerista ganha ainda mais relevância. Ele se apresenta como uma ferramenta jurídica essencial para garantir a proteção dos direitos dos consumidores lesados, permitindo a responsabilização dos sócios ou administradores da empresa por condutas que resultem em prejuízos aos consumidores, sem comprometer a continuidade do processo de recuperação judicial.
Em suma, a decisão do STJ reforça a importância da aplicação da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica e do consequente papel do IDPJ no âmbito do direito consumerista em empresas em recuperação judicial. Ela contribui para a proteção dos direitos dos consumidores e para a efetividade do processo de recuperação, garantindo um equilíbrio adequado entre os interesses das partes envolvidas.
Desse modo, o IDPJ desempenha um papel fundamental no procedimento consumerista em empresas em recuperação judicial, atuando como uma ferramenta de proteção dos direitos dos consumidores e de promoção da responsabilidade empresarial. Por meio do IDPJ, busca-se garantir um equilíbrio adequado entre os interesses dos consumidores e a necessidade de reestruturação e continuidade da empresa em crise, contribuindo para a eficácia e a legitimidade do processo de recuperação judicial.
RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. PERSONALIDADE JURÍDICA. DESCONSIDERAÇÃO. INCIDENTE. RELAÇÃO DE CONSUMO. ART. 28, § 5º, DO CDC. TEORIA MENOR. SOCIEDADE ANÔNIMA. ACIONISTA CONTROLADOR. POSSIBILIDADE. EXECUTADA ORIGINÁRIA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. EXECUÇÕES. SUSPENSÃO. ART. 6º, II, DA LREF. INAPLICABILIDADE. PATRIMÔNIO PRESERVADO. 1. A controvérsia dos autos resume-se em saber se, pela aplicação da Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, é possível responsabilizar acionistas de sociedade anônima e se o deferimento do processamento de recuperação judicial da empresa que teve a sua personalidade jurídica desconsiderada implica a suspensão de execução (cumprimento de sentença) redirecionada contra os sócios. 2. Para fins de aplicação da Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica (art. 28, § 5º, do CDC), basta que o consumidor demonstre o estado de insolvência do fornecedor e o fato de a personalidade jurídica representar um obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados, independentemente do tipo societário adotado. 3. Em se tratando de sociedades anônimas, é admitida a desconsideração da personalidade jurídica efetuada com fundamento na Teoria Menor, em que não se exige a prova de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, mas os seus efeitos estão restritos às pessoas (sócios/acionistas) que detêm efetivo poder de controle sobre a gestão da companhia. 4. O veto ao § 1º do art. 28 do Código de Defesa do Consumidor não teve o condão de impossibilitar a responsabilização pessoal do acionista controlador e das demais figuras nele elencadas (sócio majoritário, sóciosgerentes, administradores societários e sociedades integrantes de grupo societário), mas apenas eliminar possível redundância no texto legal. 5. A inovação de que trata o art. 6º-C da LREF, introduzida pela Lei nº 14.112/2020, não afasta a aplicação da norma contida no art. 28, § 5º, do CDC, ao menos para efeito de aplicação da Teoria Menor pelo juízo em que se processam as ações e execuções contra a recuperanda, ficando a vedação legal de atribuir responsabilidade a terceiros em decorrência do mero inadimplemento de obrigações do devedor em recuperação judicial restrita ao âmbito do próprio juízo da recuperação. 6. O processamento de pedido de recuperação judicial da empresa que tem a sua personalidade jurídica desconsiderada não impede o prosseguimento da execução redirecionada contra os sócios, visto que eventual constrição dos bens destes não afetará o patrimônio da empresa recuperanda, tampouco a sua capacidade de soerguimento. 7. Recurso especial não provido. STJ – RECURSO ESPECIAL Nº 2034442 – DF (2022/0334067-8). RELATOR: MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA. 2023.
redirecionada aos sócios da empresa. Tal entendimento é fundamental para garantir a efetividade do direito do consumidor, uma vez que possibilita a busca por reparação de danos mesmo em situações de crise empresarial.
Um aspecto crucial dessa decisão é a aplicação da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, prevista no artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que dispensa a comprovação de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial para sua efetivação. A teoria menor permite a responsabilização dos sócios ou administradores da empresa apenas com a demonstração do estado de insolvência e da obstrução à reparação de prejuízos.
É importante ressaltar que a decisão do STJ estendeu a aplicação da teoria menor não apenas às sociedades limitadas, mas também às sociedades anônimas, desde que os sócios ou acionistas exerçam efetivo controle sobre a gestão da empresa. Isso amplia o escopo de responsabilização dos sócios em casos de desconsideração da personalidade jurídica, independentemente do tipo societário adotado.
Além disso, a decisão esclareceu que o deferimento da recuperação judicial não suspende o prosseguimento das execuções contra terceiros devedores solidários, como os sócios da empresa em crise. Isso significa que eventuais constrições dos bens dos sócios não afetam o patrimônio da empresa em recuperação, não comprometendo, assim, seu processo de reestruturação.
papel do IDPJ no procedimento consumerista ganha ainda mais relevância. Ele se apresenta como uma ferramenta jurídica essencial para garantir a proteção dos direitos dos consumidores lesados, permitindo a responsabilização dos sócios ou administradores da empresa por condutas que resultem em prejuízos aos consumidores, sem comprometer a continuidade do processo de recuperação judicial.
Em suma, a decisão do STJ reforça a importância da aplicação da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica e do consequente papel do IDPJ no âmbito do direito consumerista em empresas em recuperação judicial. Ela contribui para a proteção dos direitos dos consumidores e para a efetividade do processo de recuperação, garantindo um equilíbrio adequado entre os interesses das partes envolvidas.
Desse modo, o IDPJ desempenha um papel fundamental no procedimento consumerista em empresas em recuperação judicial, atuando como uma ferramenta de proteção dos direitos dos consumidores e de promoção da responsabilidade empresarial. Por meio do IDPJ, busca-se garantir um equilíbrio adequado entre os interesses dos consumidores e a necessidade de reestruturação e continuidade da empresa em crise, contribuindo para a eficácia e a legitimidade do processo de recuperação judicial.