Helder Jean Thibes Junior
O abandono da causa é um fenômeno jurídico que ocorre quando uma das partes de um processo decide não mais prosseguir com a ação judicial em que está envolvida. Este ato pode ocorrer por uma variedade de razões, que vão desde o negligente abandono do processo por tempo superior a um ano, como pela falta de cumprimento de atos ou diligências que incumbe a parte, se não cumpridas em trinta dias. Na prática, o tema é geralmente consequência da falta de recursos financeiros para dar continuidade ao processo, mudança de estratégia ou prioridades por parte da parte interessada.
Justamente dentro desta temática, que a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça revogou uma decisão que havia encerrado um processo sem resolução de mérito devido ao abandono da causa. Segundo o Colegiado, mesmo diante da devolução de uma intimação com aviso de recebimento informando a insuficiência do endereço fornecido, tal fato não necessariamente presumi a inequívoca manifestação da parte, não havendo razão para o abandono da causa.
A controvérsia apresentada perante o Superior Tribunal de Justiça, originou-se de demanda instaurada em 2009, onde um condomínio residencial ajuizou face um de seus moradores, objetivando a cobrança de taxas condominiais. Contudo, uma vez infrutíferas as tentativas de localizar a referida ré, no ano de 2018, requereu-se a suspensão do processo, solicitação deferida pelo juízo de primeira instância.
Após transcorrido prazo de suspensão, o condomínio, por intermédio de seu representante legal, foi intimado para dar seguimento ao feito. Entretanto, o aviso de recebimento correspondente a intimação enviada para o Condomínio retornou com a informação de que o endereço fornecido era insuficiente. Subsequentemente, no ano seguinte, a sentença proferida decretou a extinção do processo sem resolução de mérito, em razão do abandono da causa por parte do Autor. O condomínio interpôs recurso, porém a decisão foi mantida em instância superior, havendo a busca à intervenção do STJ para análise da matéria.
Conforme argumentou o Superior Tribunal de Justiça, o parágrafo único do artigo 274, do Código de Processo Civil estabelece a presunção de validade das intimações realizadas para o endereço constante nos autos, mesmo que não sejam recebidas pessoalmente pelo interessado, desde que qualquer alteração não tenha sido devidamente comunicada ao órgão judiciário.
Contudo, a ministra Nancy Andrighi, na qualidade de relatora do caso, elucidou que a presunção de validade da intimação prevista no parágrafo único do artigo 274 “admite prova em contrário do endereçamento incorreto da carta” por qualquer motivo, como, por exemplo, a inclusão do endereço atualizado nos autos, embora inadvertidamente. A relatora também ressaltou que o dispositivo legal em questão não exclui a utilização de outros meios de comunicação. O artigo 275, por exemplo, estipula que a intimação será efetuada por oficial de justiça quando as tentativas por meios eletrônicos ou postais resultarem infrutíferas.
Por fim, a ministra salientou que o abandono da causa “pressupõe a manifesta negligência da parte autora”. Portanto, se for evidenciado que o autor não tinha a intenção de abandonar a causa, não é cabível a extinção do processo, mesmo após o transcurso do prazo de 30 dias.
Dessa forma, a decisão do Superior contribui para uma compreensão mais abrangente das regras processuais aplicáveis em casos de abandono da causa, mais especificadamente abordadas pelo artigo 485, II e 267 do CPC, e evidenciam sobretudo, a importância do devido cumprimento dos procedimentos legais para a efetivação do processo civil.
Referências
HIGÍDIO, José. Informação de endereço insuficiente não justifica extinção de ação por abandono de causa. Consultor Jurídico.
Disponível em:
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 mar. 2015.