Rubens Vasconcelos Calixto Neto
Os tribunais superiores pátrios têm rechaçado a utilização da nulidade de algibeira (ou de bolso) para arguir nulidade processual após o julgamento do mérito e o trânsito em julgado.
O termo “algibeira” é sinônimo de bolso e, no contexto, refere-se a uma nulidade processual que a parte não alega oportunamente para, caso venha a ser derrotada na ação, por uma questão de estratégia, argui a nulidade posteriormente com intuito de anular a decisão que lhe não é favorável.
Ou seja, o comportamento da parte é contraditório, nesse caso. Se assim não o fosse, admitir-se-ia que a parte guardasse a nulidade para ser utilizada quando a interessar, e caso venha ser prejudicada.
Os tribunais nomofilácicos, os quais interpretam as normas, como o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, entendem que a nulidade processual deve ser arguida no momento da ciência pela parte, em razão do princípio da boa-fé processual, assim, consideram a nulidade de algibeira aquela nulidade oportuna, em que somente é arguida pela parte como estratégia numa perspectiva melhor de conveniência futura, conforme fundamentado Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, no julgamento do AgRg no RHC 170.700/PE, em 27.09.2022.
Aliás, no que diz respeito à parametrização das nulidades, refere-se a nulidade absoluta aquela que deve ser conhecida ex officio pelo órgão jurisdicional, em que não se consuma pela preclusão. Por outro lado, a nulidade relativa é aquela que deve ser provocada pela parte, não podendo o juízo competente argui-la de ofício, e que está sujeita à preclusão temporal. Assim, não há lógica jurídica em se falar de nulidade de algibeira em relação às nulidades relativas, uma vez que estas precluem.
O fundamento central da nulidade de algibeira é a não observância à boa-fé processual e à lealdade processual, que podem ser definidas como regras de moralidade e probidade a todos que participam do processo, como partes, juízes, auxiliares, membros do Ministério Público. Este princípio esta positivado no artigo 5º do Código de Processo Civil, como norma geral do processo, e impõe às partes o dever de se utilizarem de meios morais e leiais, sem o emprego de artifícios fraudulentos, pois o processo, além do instrumento para eliminação dos conflitos, é o meio de pacificação geral da sociedade.
Assim, ainda que grave o vício processual, este não acarreta necessariamente na decretação da invalidade do ato jurídico, pois a sanção de invalidade pode ser afastada quando presente a violação à boa-fé objetiva pela parte que alega a nulidade em momento conveniente.
Inclusive, o artigo 278 do Código de Processo Civil determina que “a nulidade dos atos deve ser alegada na primeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão”.
Então, se somente há sentido em utilizar-se da nulidade de algibeira às nulidades absolutas, e elas devem ser alegadas na primeira oportunidade, que dizer que, em verdade, há a preclusão das nulidades absolutas?
Em linhas gerais, o entendimento majoritário do STJ é no sentido de somente aplicar a “nulidade de bolso” quando a tese defensiva busca a anulação de um ato processual sem demonstrar o efetivo prejuízo causado à parte.
Deste modo, se a tese de defesa tem como pretensão mediata a declaração de nulidade de decisão judicial pretérita, é importante que seja demonstrado objetivamente ao órgão jurisdicional que a nulidade arguida causou efetivamente prejuízo ao postulante.
Tal entendimento possui alicerce no artigo 563 do Código de Processo Penal, o qual dispõe que é ônus da defesa demonstrar que a eventual decisão, em que se pode interpretar como eventual vício, causou algum tipo prejuízo insanável.
Em síntese, a aplicação da nulidade de algibeira encontra restrições significativas dentro do ordenamento jurídico brasileiro. A jurisprudência predominante dos tribunais superiores indica que a nulidade processual deve ser alegada de forma tempestiva e não pode ser usada como estratégia inoportuna para a anulação de decisões que não foram inicialmente questionadas. A exigência de que a parte prove o prejuízo efetivo causado pela nulidade arguida reforça a necessidade de que a alegação de nulidade seja fundamentada e demonstrada adequadamente, alinhando-se com o princípio da boa-fé processual e com a necessidade de garantir a estabilidade das decisões judiciais.